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Livros de Cabeceira e outras histórias

Todas as formas de cultura são fontes de felicidade!

Livros de Cabeceira e outras histórias

Todas as formas de cultura são fontes de felicidade!

"A melodia do amor", Lesley Pearse

Charneca em flor, 16.08.14

As férias, que já passaram, são uma excelente oportunidade para ler. Uma das obras que me encheram os dias e as noites de férias foi "A melodia do amor" de Lesley Pearse. Apesar de ter lido na versão ebook, isso não diminuiu o prazer da leitura. Já devo ter lido a maioria dos livros desta autora editados em Portugal e ela nunca me desilude. Os livros de Lesley Pearse têm em comum o facto de a personagem central ser uma mulher, uma mulher forte que enfrenta ventos e tempestades para ser feliz. No entanto, ela também constrói excelentes personagens masculinas. O enquadramento histórico também costuma ser muito bom. Em suma, são histórias bem construídas. A princípio fiquei um bocadinho aborrecida porque a história tinha alguns pormenores em comum. A heroína vive em Inglaterra, no século XIX, passa por muitas dificuldades e, a dada altura, resolve emigrar para os Estados Unidos da América. Beth, assim se chama a personagem, viaja acompanhada pelo irmão depois de perderem os pais. Acabam por ir para o Canadá por causa da corrida do ouro do Klondike. Beth tem um talento inato para tocar violino o qual a acompanha para todo o lado. A música ajuda-a a ganhar a vida e a arranjar forças para enfrentar os problemas e as tristezas. Ler Lesley Pearse ajuda-nos a ter esperança num amanhã mais feliz por mais negro que seja o momento presente. Como eu dizia no início, nunca me desilude.

 

"Os dedos dela deslizavam como mercúrio pelas cordas e arco fazia-as cantar. Movia todo o corpo ao ritmo da música, de olhos fechados e completamente absorta.

Sentiu mais do que viu o apreço do público: o bater dos pés tornou-se mais forte, e os que dançavam soltavam gritos de alegria. De repente, soube que fora para aquilo que nascera, para tocar uma música viva e alegre que a elevava a ela e aos que a ouviam até um lugar melhor. Esqueceu-se que estava num navio rodeada de pessoas de cara pálida e suja e sentiu-se como se estivesse a dançar descalça num prado salpicado de flores à luz do sol.

Quando a música acabou e voltou a abrir os olhos, viu que tinha levado toda a gente para o mesmo lugar. À sua volta só havia olhos brilhantes, sorrisos rasgados e rostos molhados de suor." 

Granta 3, Casa

Charneca em flor, 06.08.14

Eu ia fazer uma modesta análise sobre a leitura da Granta 3 que terminei há dias mas, entretanto, li esta que está tão bem feita que já não tive coragem. Faço minhas, as palavras do autor Pedro Miguel Silva. Só vou acrescentar que, das 3 já publicadas em Portugal, esta foi a minha preferida. Gostei muito do tema. A fotonovela estava fantástica. Recordei a minha infância quando revirava as revistas antigas da minha mãe nas quais havia sempre fotonovelas. 

Gostei do site, Deus me Livro. Vou continuar a acompanhá-lo. Recomendo.

 

 

"Uma Viagem à Índia", Gonçalo M. Tavares

Charneca em flor, 02.08.14

 

 

"A grande epopeia dos nossos tempos" nas palavras do Le Monde des Livres e também foi, para mim, uma epopeia lê-lo. Nunca mais acabava. Não que o livro fosse chato ou mau mas é um livro difícil de ler. Primeiro que tudo porque é preciso alguma concentração o que, nos dias que correm, nem sempre é possível. Este não é um livro de viagens embora, pelo título, pudesse parecê-lo. Bloom, a personagem central, enceta uma viagem física mas, principalmente, espiritual de aprendizagem, auto-conhecimento e também de esquecimento, de corte com o seu passado. Cruza-se com outras personagens, umas amigáveis e outras nem por isso. A Índia é o objectivo final da viagem só que, como na vida real, o caminho faz-se caminhando. O caminho que ele faz, passando por várias cidades, torna-se muito mais importante do que a Índia propriamente dita. Em certas partes do livro até se pode ficar confuso se a viagem é mesmo física ou se é apenas até à alma do Bloom.

A organização que Gonçalo M. Tavares deu à sua epopeia é muito semelhante à organização de uma das maiores obras portuguesas, "Os Lusíadas" estendendo-se ao longo de X Cantos, cada um deles com 100 estrofes (em média). Não lhe chamaria poesia, antes prosa poética. 

Não sou capaz de dizer se amei ou odiei esta obra. Digo antes que é uma obra que desassossega, que nos faz sair da nossa "zona de conforto" literária. Vale a pena arriscar lê-la para se conhecer melhor a literatura portuguesa contemporânea. Até acho que sou capaz de experimentar outros livros do autor quando estiver refeita deste desassossego.

 

 

Falaremos da hostilidade que Bloom,

o nosso herói,

revelou em relação ao passado,

levantando-se e partindo de Lisboa

numa viagem à Índia, em que procurou sabedoria

e esquecimento.

E falaremos do modo como na viagem

levou um segredo e o trouxe, depois, quase intacto.

                                                      

                                                                              Número 10, Canto I

 

 

 

É evidente que me preparei com cuidade

para avançar para o outro lado do mundo,

e mais longe que isso: para o outro lado de mim próprio.

Pus na mochila as ferramentas para a luz

e para sede, mapas da Europa, uma Bíblia,

um livro sobre a alma e outro sobre o funcionamento das células,

e ainda dois valiosos livros clássicos; juntei dinheiro,

esperei que o vento sossegasse e apanhei um avião para Londres,

a minha primeira paragem.

 

                                                               Número 85, Canto IV