A Cidade de Vapor, Carlos Ruiz Zafón
Este livro é uma pequena preciosidade. Carlos Ruiz Zafón faleceu em Junho de 2020. Esta obra estava a ser preparada quando o escritor ficou doente. Como acabou por falecer, esta reunião dos seus contos foi publicada postumamente. Zafón é um dos mais brilhantes escritores contemporâneos. Ninguém fica indifente às histórias que ele criou. A série "Cemitério dos Livros Esquecidos" é fenomenal. Ainda não me aventurei a ler o último, "Labirinto dos Espíritos", porque é uma empresa e tanto já que o livro tem mais de 800 páginas. Por isso foi com imenso prazer que li este pequeno tesouro. São, apenas, 11 contos, completamente, imersos no universo característico de Zafón. As ruas de Barcelona, as sombras, as névoas, as estranhas personagens são uma constante tal com a sua cativante maneira de contar histórias.. Até Gaudí, o brilhante arquitecto catalão, faz uma aparição num dos contos. Para quem ainda não leu nenhum dos livros de Carlos Ruiz Zafón, esta é uma obra para começar. Nestas páginas, Zafón parece "ensaiar" aquilo que, mais tarde, deu origem ao "Cemitério dos Livros Esquecidos". Para quem é fã, pode fazer a sua despedida do falecido escritor através destes pequenos contos.
"Sempre invejei essa capacidade que algumas pessoas têm de esquecer, pessoas para as quais o passado é uma mudança de estação ou uns sapatos velhos que basta condenar ao fundo de um armário para que fiquem incapazes de refazer os passos perdidos. Eu tive o infortúnio de recordar tudo e de tudo, por sua vez, se recordar de mim. Recordo uma primeira infância de frio e solidão, de instantes mortos a contemplar o cinzento dos dias e aquele espelho negro que enfeitiçava o olhar do meu pai. Quase não tenho memória de nenhum amigo. Sou capaz de evocar rostos de miúdos do Barrio de la Ribera com que por vezes brincava ou lutava na rua, mas nenhum que quisesse resgatar do país da indiferença. Nenhum exceto o de Blanca."