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Livros de Cabeceira e outras histórias

Todas as formas de cultura são fontes de felicidade!

Livros de Cabeceira e outras histórias

Todas as formas de cultura são fontes de felicidade!

Uma História da Leitura, Alberto Manguel

"A leitura é, desde o início, a apoteose da escrita"

Charneca em flor, 28.04.21

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Alberto Manguel é argentino mas já viveu em inúmeros países. Trabalhou como escritor, tradutor, editor e foi director da Biblioteca Nacional da Argentina. Desde criança que os livros ocupam um grande espaço na sua vida. Da sua biblioteca pessoal fazem parte mais de 40000 livros que foram oferecidos, recentemente, à cidade de Lisboa onde darão origem ao Centro de Estudos da História da Leitura do qual será director. Já ouvi falar dele há algum tempo e achei que este livro se enquadrava muito bem no tema do mês de Abril do clube de leitura a que aderi este ano, "Um livro que fala de livros".

Não é o livro mais fácil de ler já que não se trata de um romance. Não é um livro que se leia por distracção, embora ler seja uma excelente distracção. Também não é uma História exaustiva da leitura. A meu ver, é a História que resultou da investigação que o autor fez sobre a leitura ao longo dos tempos e dos diferentes caminhos a que essa investigação o foram conduzindo. Para além disso, o livro é enriquecido pela própria experiência, ao longo da vida, do autor enquanto leitor. 

Através desta obra confrontei, igualmente, a História da Leitura da Humanidade com o percurso que eu própria tenho feito enquanto leitora. Por exemplo, no capítulo "Ler imagens" regressei aos anos 70 quando ainda não sabia ler e inventava histórias enquanto olhava para os desenhos dos meus livros.

Esta obra está dividida em 4 partes mas há 2 partes principais. A primeira grande secção aborda vários aspectos da leitura, daquilo que pode dificultar ou facilitar este acto, de como a leitura começou por ser uma actividade de elites e de como evoluiu até ser acessível a todos. A outra grande parte baseia-se no leitor e na maneira como o leitor se relaciona com os livros, como escolhe o que lê e como interpreta aquilo que lê.

A maneira como este livro está construído faz-nos perceber porque é que Alberto Manguel escolheu chamar-lhe "Uma História da Leitura" e não "A História da Leitura". Esta a História de Manguel mas se fosse a minha História, ou de outro amante dos livros, seria muito diferente, com toda a certeza.

"No entanto, sob este acaso aparente, há um método: este livro que vejo diante mim é a história da leitura, mas também dos leitores comuns, dos indivíduos que, ao longo das eras, preferiram certos livros a outros, aceitaram nalguns casos o veredicto dos mais velhos, mas noutras ocasiões resgataram do passado títulos esquecidos, ou arrumaram nas prateleiras das suas bibliotecas os eleitos dos seus contemporâneos. Esta é a história das suas pequenas vitórias e dos seus sofrimentos secretos, e da maneira como essas coisas se passaram. Este livro é a crónica minuciosa da maneira como tudo isso aconteceu, na vida quotidiana de algumas pessoas comuns, descoberta, aqui e ali, em memórias de família, anais municipais, descrições da vida em lugares distantes e em tempos recuados."

Desafio dos Lápis de Cor, balanço final

Charneca em flor, 21.04.21

Se fosse uma 4a feira qualquer das últimas 13 semanas, hoje seria dia de publicar um texto de ficção inspirado por um lápis de cor. Mas o desafio já terminou. O balanço que faço da minha participação é muito positivo. Consegui escrever 13 textos sem falhar dia nenhum e ainda consegui construir uma história com vários capítulos. Cada cor era um capítulo diferente. Nem sempre foi fácil enquadrar a cor na história mas acho que o relato até foi bem conseguido. 

Para construir esta narrativa, utilizei algumas memórias da minha adolescência, dos meus problemas e dos meus sonhos para construir as minhas personagens e aquilo que foi acontecendo. Não tinha nada planeado, inicialmente. Foi semana a semana que a história foi crescendo ao sabor da inspiração e colorida com cada lápis da caixa da Fátima Bento

Nem sempre consegui mas tentei ir lendo os textos dos outros participantes e devo dizer que se escreveram verdadeiras pérolas de prosa e poesia. 

Obrigada à Fátima pela ideia e a todos os participantes que me acompanharam, mesmo aqueles que não conseguiram chegar à última cor. Aprendi sempre alguma coisa com cada um de vocês 

Fátima Bento,  ConchaA 3a FaceMaria AraújoPeixe FritoImsilva, Luisa de SousaMariaAna DCéliaGorduchitaMiss LollipopAna MestreAna de DeusCristina Aveirobii yue, José da Xá , João-Afonso Machado e Marquesa de Marvila

Até ao próximo desafio.

 

Já chegou

Obrigada, Fátima Bento

Charneca em flor, 19.04.21

Se há passatempo, ou giveway se for no Instagram, contem comigo. Especialmente, se houver livros ou plantas, o meu último vício. E se houver um tema sobre o qual escrever, ainda melhor.  A Fátima Bento desafiou os seus seguidores para um passatempo comemorativo dos 7 anos do seu blogue "Porque Eu Posso" no qual eu tive o prazer de participar. Nunca pensei ser uma das premiadas mas a verdade é que ganhei um dos livros que ela tinha para oferecer. E livros nunca são demais, pois não?

O livro que me calhou foi este

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Algo me diz que, apesar do título, este livro não será a melhor opção para adormecer . A sinopse termina com as seguintes palavras:

"Passo a passo, num enredo de tremendo suspense e excitação, Mary Higgins Clark releva, uma vez mais, o domínio da arte que tornou os seus livros best-sellers a nível mundial. Ela oferece ao leitor um mistério inquietante, uma dúvida de identidade intrigante e um elenco fascinante - no seio do qual poderá encontrar-se um assassino sem escrúpulos..."

Nunca li nada desta autora mas até aprecio policiais. Não costumo ler livros em formato de livro de bolso mas não deixa de ser um formato portátil. O formato de um livro tem uma importância primordial a ponto de o autor do livro que estou a ler, "Uma História da Leitura" de Alberto Manguel, lhe dedicar um capítulo

Não o vou ler já porque tenho outros livros na "calha" mas acho que o vou integrar nos livros do clube de leitura em que participo, Uma Dúzia de Livros.

 

Meu Nome é Saudade, Luís Trigacheiro

Charneca em flor, 19.04.21

Luís Trigacheiro venceu, há uns meses, a última edição do The Voice Portugal. Ontem lançou o seu primeiro single inédito em várias plataformas e também, em directo, na final do The Voice Kids. Com um vídeo encantador para mim porque traz um cheirinho a Alentejo, uma letra inspiradora e a voz inconfundível de Luís Trigacheiro, aqui fica a música desta semana

Boa semana.

Desafio dos Lápis de Cor #branco

Epílogo

Charneca em flor, 14.04.21

Sofia olhava pela pequena janela do avião. Lá fora, um mar de nuvens brancas. Apetecia-lhe ir lá para fora e lançar-se para aquela imensidão branca e fofa. A sua editora dormia a sono solto na cadeira ao lado. Ambas iam a caminho do Brasil para um festival literário. O seu livro tinha feito o pleno ao ser muito elogiado pela crítica e também muito bem recebido pelos leitores. Nunca poderia ter imaginado um percurso assim para o seu primeiro romance. Aquela viagem tinha sido tão inesperada porque nunca poderia esperar que a convidassem a ela, uma perfeita desconhecida, para participar num evento daqueles.

Por outro lado, Sofia começara a busca incessante por uma nova história que fosse tão boa como a do seu primeiro romance, ou melhor, se possível. Quando um primeiro romance tem um sucesso muito grande, o bloqueio da folha branca é assustador. Sofia tinha medo de não ser capaz de escrever mais nenhum romance. Assoberbada com os seus compromissos, sentia que a torneira da inspiração se tinha fechado. E estava tão perra que não parecia possível abri-la novamente.

Aliás, a sua própria vida era uma página em branco e ela não sabia que caminho que seguir. Dedicar-se a tempo inteiro à escrita? Continuar a trabalhar e escrever nas horas vagas? Escrever o livro que, agora, a enchia de glória não fora assim tão fácil como lhe parecera ao início. Para chegar ao resultado final foi preciso trabalhar muito para chegar ao resultado final. Seria ela capaz de viver da escrita?!

Como se este dilema não fosse suficiente, Tomás reaparecera na sua vida. Também ela se apaixonara por ele, outra vez. Não com a inocência da juventude mas com a intensidade de mulher adulta. Nas últimas semanas, tinham estado juntos sempre que as respectivas ocupações permitiram. Ela tirara férias para se dedicar à promoção do livro mas esse tempo estava a esgotar-se. Em breve ela teria que voltar a Bruxelas onde trabalhava. Antes de Sofia embarcar, tinham tido uma discussão sobre relações à distância e o tema ficara em standby. Tomás tinha um filho e não o queria nem podia abandonar como a mãe fizera. Não podia largar tudo e ir viver com ela para Bruxelas se ela continuasse lá. Sofia estava tão habituada a viver sozinha que a hipótese de voltar para Portugal e ir viver com o Tomás e tornar-se madrasta, essa palavra horrível, de um adolescente a assustava de sobremaneira.

Apesar do turbilhão que ia na sua cabeça, lá adormeceu até ao fim da viagem. O sono foi agitado enquanto sonhava com folhas brancas que a soterravam não a deixando respirar.

Horas depois, chegaram ao destino e instalaram-se no hotel. A editora convidara-a para jantar mas a viagem deixara-a indisposta. Preferiu ficar no quarto e aproveitar para enfrentar a folha em branco, corajosamente. Mas antes, aproveitando a internet fornecida pelo hotel, foi ver o email e, dom surpresa, encontrou um email de Tomás. Com o coração acelerado e com medo que ele quisesse pôr um ponto final na relação daquela forma, abriu-o.

As palavras de Tomás comoveram-na até às lágrimas e lembrou-se daquele bilhete que ele lhe atirara à varanda há tantos anos:

“Meu amor,
A vida ensinou-me que devemos lutar por aquilo em que acreditamos. E eu acredito no nosso amor. Já me arrependi muito por não ter reagido da melhor forma quando éramos jovens e ter permitido que te afastasses de mim sem fazer nada para compreender o que se passava contigo. Não posso, nem quero, perder-te outra vez.
Estou a escrever-te a conselho do meu filho. Sim, o meu filho adolescente é o meu melhor conselheiro. Sabes o que ele me disse quando lhe contei a nossa história e os nossos dilemas?
《“Papá, se gostas assim tanto dela, não a deixes fugir. Se tiverem que viver à distância e tu tiveres que viajar com frequência para estar com ela, faz isso. Não te preocupes comigo. Tu és o melhor pai que eu poderia ter tido. Não me estarás a abandonar. Eu nunca irei sentir isso, papá. Nunca te vi tão feliz. Tens esse direito. Mas a Sofia também tem o direito de ser feliz. E se para isso for necessário que ela mantenha a sua independência, pois que seja assim. E tu só tens que aceitar. Moderniza-te, paizão. Já lá vai o tempo em que as mulheres deixavam tudo para seguir um homem.》

E não é que o meu filho tem razão?! Eu estou disposto a fazer a minha parte nesta relação e vivê-la segundo os teus termos. Se decidires continuar em Bruxelas, eu vou apoiar-te e vou fazer tudo o que estiver ao meu alcance para que a nossa relação à distância funcione. Se voltares a Portugal mas preferires ter a tua casa, eu também aceitarei. Confesso que será difícil mas não se pode prender uma borboleta. Ela só será feliz se voar livre.Eu quero construir algo contigo. Não te posso perder outra vez. Qual será o edifício que resultará, não sei. O futuro o dirá.
Amo-te muito e apetecia estar aí contigo e cobrir-te de beijos.”

O coração de Sofia continuava acelerado. Quando se despediram, Tomás voltara a insistir para que ela fosse viver com ele e com o filho. Não o imaginava capaz de escrever aquelas palavras. Se ele estava disposto a ceder e se tinha criado um filho com aquela clarividência, valia a pena dedicar-se aquele amor. Não sabia o que iria resultar dali mas estava decidida a descobrir.
A folha branca da sua vida começava a encher-se de palavras. Agora só lhe restava continuar a escrevê-la, a quatro mãos ou quem sabe a seis. Talvez fosse engraçado ser madrasta daquele miúdo.

 

Fim

Participam neste Desafio da Caixa de Lápis de Cor da Fátima Bento, as brilhantes ConchaA 3a FaceMaria AraújoPeixe FritoImsilva, Luisa de SousaMariaAna DCéliaGorduchitaMiss LollipopAna MestreAna de DeusCristina Aveirobii yue, os brilhantes  José da Xá e João-Afonso Machado.

Agora também com a participação especial da nobreza na pessoa a talentosa e divertida Marquesa de Marvila

 

Obrigada por me acompanharem nesta aventura.

Terra Prometida, Jónatas Pires

Charneca em flor, 12.04.21

Jónatas Pires é um jovem músico (33 anos ainda é jovem, não é?) que foi menbro fundador da banda "Os Pontos Negros", formação essa que gerou tanto paixão como crítica deixando marcas no rock português entre 2007 e 2011. Depois de um interregno nas canções, voltou ao panorama musical no ano passado. A música que partilho hoje é o segundo single do álbum que será lançado no próximo mês. A letra, assim como o vídeo, leva-nos ao Vale da Amoreira, terra que pertence ao concelho da Moita na Margem Sul, onde abundam os bairros sociais. Jónatas Pires conta, à sua maneira, uma história que pode ser olhada como autobiográfica mas que também pode ser a historia de tantas pessoas que nascem, crescem e vivem nos subúrbios.

Boa semana.

 

 

 

Desafio dos Lápis de Cor #castanho escuro

Apaixonei-me por ti, outra vez

Charneca em flor, 07.04.21

Lentamente, Sofia foi despertando ao sentir o seu corpo tocado pela luz da manhã. No ar pairava um delicioso aroma a café acabado de fazer. Confusa, olhou em volta sem se aperceber bem de onde estava. Ao seu lado esquerdo, um jovem adolescente sorria-lhe, encerrado na sua moldura.

De repente, as lembranças surgiram em catadupa. O reencontro com o seu primeiro amor tinha despoletado uma inundação de emoções que ela julgava devidamente enclausuradas como água numa represa. Quando Tomás lhe estendeu o livro para que o autografasse foi como se as comportas do seu coração se abrissem e deixassem correr as recordações da adolescência.

No final da sessão de autógrafos, Sofia sentiu que Tomás era como um magnete que a atraía e ao qual ela não conseguia escapar. Na verdade, também não fez muito esforço para o evitar. Inevitavelmente, saíram juntos com a intenção de tomarem um café e recuperaram os anos que tinham passado.

Ambos falaram das suas vidas. Sofia partilhou o seu percurso universitário, a experiência do Erasmus e o seu trabalho em vários países da Europa. Ambos soltaram gargalhadas com as histórias caricatas que Sofia contavam com muita graça. Ela falou, também, da aventura de ter saído da sua zona de conforto para escrever um livro e da coragem que teve que ter para o mostrar a alguém. Tomás, a medo, falou-lhe da sua relação turbulenta com Ana, de como tinham sido pais tão cedo o que o levara a abandonar a faculdade no 1° ano para começar a trabalhar.

A conversa corria tão agradável e escorreita que se prolongou para um jantar à beira-mar, na mesma praia onde tinham passado os últimos momentos juntos. A magia daquele lugar, ao entardecer, reacendeu a química que havia entre eles tornando o ar que os rodeava electrizante.

Emocionado, Tomás pegou-lhe e pediu perdão por, no passado, não ter lutado pelo amor que sentia por ela. Quando ela acabara o namoro sem grandes explicações, ele sentira-se rejeitado. Esse sentimento acabara por conduzi-lo para os braços de Ana com quem vivera um amor obsessivo, mais baseado na atracção física do que na comunhão de almas. Uma relação que acabara, repentinamente, quando o filho de ambos tinha 3 anos porque Ana o abandonou, não tinha sido talhada para a vida familiar. Sofia, pela sua parte, desculpou-se por não lhe ter explicado a razão que a levara aquela atitude e lamentou que a relação dele não tivesse durado.

Sofia e Tomás estavam tão satisfeitos na presença um do outro que mal tocaram na comida. No fim do jantar, de mãos dadas, caminharam pela praia enquanto as ondas lhes beijavam os pés descalços. Instalou-se um silêncio aconchegante entre os dois. A brisa fez com que os braços nus de Sofia se arrepiassem. Tomás acariciou-a para a aquecer. Quase que era possível ouvir o bater sincronizado dos seus corações. O beijo que trocaram incendiou-lhes os corpos e não mais se desligaram. Completamente hipnotizados um pelo outro, mal conseguiram chegar a casa de Tomás para darem largas à paixão que estivera aprisionada durante tantos anos.

Já completamente desperta, Sofia descobriu uma t-shirt de Tomás e vestiu-a para descobrir de onde vinha o aroma a café. Chegou à cozinha sem fazer barulho e surpreendeu Tomás, de costas para a porta, a preparar um tabuleiro com um belo pequeno-almoço. Para não estragar a surpresa, voltou para o quarto.
Alguns minutos depois, ele entrou no quarto com um tabuleiro recheado com apetitosas iguarias.

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Imagem daqui

- Oh, já acordaste?! – Tomás deu-lhe mais um beijo apaixonado enquanto tentava pousar a comida. Já perdera a conta de quantos foram. Parecia que, num dia, lhe queria dar todos os beijos que não lhe dera nos últimos 15 anos.

- Tu não existes. Eu mereço isto tudo?! Cheira tão bem a café. E o que é isto? Um croissant de chocolate?! – descobriu ela deliciada.

- Ainda me lembro de que eras viciada em chocolate. Espero que continues a gostar. 

Enquanto saboreavam, com gosto, a comida preparada por Tomás, iam trocando carícias. Era como se aquele tempo todo não tivesse passado e voltassem a ser adolescentes.

- Sabes, Sofia, ontem quando te vi tão segura e maravilhosamente bela, apaixonei-me por ti outra vez. Agora que te encontrei, não mais te perderei de vista.

Sofia ouviu aquelas palavras enquanto bebia aquele delicioso líquido castanho muito escuro. O seu coração derreteu-se. As últimas horas tinham sido intensas e felizes mas não tinha a certeza de que estava disposta a abdicar da sua independência para deixar o passado voltar à sua vida.

 

Participam neste Desafio da Caixa de Lápis de Cor da Fátima Bento, as brilhantes ConchaA 3a FaceMaria AraújoPeixe FritoImsilva, Luisa de SousaMariaAna DCéliaGorduchitaMiss LollipopAna MestreAna de DeusCristina Aveirobii yue, os brilhantes  José da Xá e João-Afonso Machado.

Agora também com a participação especial da nobreza na pessoa a talentosa e divertida Marquesa de Marvila

"rapariga, mulher, outra", Bernardine Evaristo

Charneca em flor, 06.04.21

Há algum tempo que eu me apercebi que leio, maioritariamente, livros escritos por homens. Daí ter feito algumas tentativas de privilegiar obras escritas por mulheres. Nos últimos meses tenho ouvido, recorrentemente, que se lêem muitos livros escritos pelo típico homem branco, heterossexual e ocidental. Assim quando peguei neste livro percebi que era uma excelente oportunidade para uma leitura que rompia com este estereótipo. Teria sido uma excelente opção para o clube de leitura, no passado mês de Fevereiro, cujo propósito era ler um livro fora da minha zona de conforto.

A autora, Bernardine Evaristo, é anglo-nigeriana e já tem obra extensa e abrangente em termos de género literário. Este romance, “rapariga, mulher, outra" foi galardoado com o Man Booker Prize de 2019, foi considerado livro de ficção do ano do British Book Awards 2020 (e a sua autora foi considerada autora do ano), foi, ainda, finalista do Women's Prize de Ficção de 2020 e do Orwell Prize de Ficção Política de 2020. Com todo este reconhecimento, comecei a ler este livro com muita expectativa.

Tal como o título indica, esta é um livro sobre mulheres, maioritariamente negras, com vivências diferentes mas que têm em comum a multiculturalidade resultante da diáspora e do colonialismo britânico. As personagens centrais são doze e a autora conseguiu construir estas personagens com bastante densidade. É-nos dado a conhecer as suas histórias de vida, as suas relações amorosas e de amizade bem como a batalha que cada uma empreende para encontrar o seu lugar na sociedade. No entanto, mais do que um romance ou um conjunto de histórias, este livro é um manifesto político que aborda temas intemporais como a orientação sexual, a identidade de género, a violência doméstica, o racismo estrutural ou quotidiano, a falta de oportunidades ou a pobreza, física e de espírito. Nem o Brexit foi esquecido.

O livro lê-se muito bem até porque a escrita de Bernardine é muito cativante e divertida e é fácil identificarmo-nos com as situações vividas pelas personagens mesmo para quem tem uma realidade muito diferente daquelas que são retratadas nesta obra. Até o grafismo do livro saí fora daquilo que são os parâmetros normais de um romance havendo, nalgumas partes, uma interessante distribuição das palavras nas páginas.

Para mim, foi também uma lição de tolerância e empatia e essa é uma das funções da literatura que faz cada vez mais falta neste mundo confuso em que vivemos.

 

"esta criatura indómita que habita este lugar selvagem, com cabelos cor de metal e uns olhos ferozes que se cravam em nós

é mãe dela

são o mesmo

são feitas do mesmo

que interessa a cor da pele? porque chegou a achar que isso interessa?

neste momento o que ela sente é tão puro e primevo que quase a esmaga

são mãe e filha e uma e outra estão a reajustar toda a ideia que faziam do seu eu

a sua mãe está tão perto que pode tocar-lhe

chegou a temer não sentir nada, ou que a mãe não demonstrasse ter-lhe amor ou afeto e fosse fria

mas como se enganou, estão as duas com os olhos rasos de lágrimas e é como se os anos estivessem a andar muito depressa para trás até que deixa de existir tudo o que uma e outra viveram

não importa o que sentem ou dizer seja o que for

só importa que estão ali

juntas."

 

Eu jurei, Rainhas do Autoengano

Charneca em flor, 05.04.21

Uma portuguesa e duas brasileiras conhecem-se num jantar, escrevem música e depois presenteiam-nos com esta maravilha

Madalena Palmeirim, Natalia Green e Zoe Durey são as rainhas do Autoengano partilhando o amor romântico e as desilusões inevitáveis das mulheres que amam demais. É assim que são descritas no spotify.

Espero que gosrem e boa semana.