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Livros de Cabeceira e outras histórias

Todas as formas de cultura são fontes de felicidade!

Livros de Cabeceira e outras histórias

Todas as formas de cultura são fontes de felicidade!

Eu sou do Roque, Marco Rodrigues

Charneca em flor, 31.05.21

Quando se juntam várias pessoas talentosas e corajosas, só pode dar uma grande música. O brilhante músico David Fonseca escreveu e compôs um tema muito divertido, o fadista Marco Rodrigues teve a coragem de interpretar uma música de um estilo ligeiramente diferente do que é habitual e a jovem música Cláudia Pascoal, em conjunto com Ricardo Leite, realizou um dos vídeos mais divertidos dos últimos tempos. Esta música não me sai da cabeça. É o som ideal para ouvir logo pela manhã porque dispõe bem para enfrentar o dia e a semana. 

Só a loucura saudável de David Fonseca para fazer este refrão 

Eu sou do roque
Não te deixes enganar pelo meu fato de gala
Cá dentro há uma alma inquieta que está sempre à espreita
Pelo mosh nesta sala
Eu sou do roque
E vou mostrar a todos o roque que o fado tem
Sou todo xutos, sou rastilho para os putos que anseiam pela festa
Sou guitarras, sou cobain

 

P.S. - O guarda roupa usado por Marco Rodrigues é qualquer coisa de espectacular. 

Novas Cartas Portuguesas

Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta, Maria Velho da Costa

Charneca em flor, 25.05.21

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Embora o mês de Maio ainda não tenha acabado, eu já terminei a minha leitura deste mês do clube/desafio de leitura a que aderi este ano. O tema proposto era "Um livro que tenha sido proibido". Já há uns tempos que tinha optado pelo "Novas Cartas Portuguesas" de Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa.

Este livro começou a ser escrito em 1971 e foi publicada em Abril de 1972. As autoras partiram do romance epistolar "Lettres Portugaises" do séc. XVII cuja autoria é polémica porque foi atribuída a Mariana Alcoforado, freira enclausurada em Beja, mas também a um autor francês. O livro "Cartas Portuguesas" é um conjunto de 5 cartas de amor supostamente enviadas pela freira Mariana Alcoforado a um oficial francês. Tendo este amor proibido como ponto de partida, as "Três Marias" elaboraram este livro a 6 mãos que albergou uma série de estilos literários como sejam o epistolar, o poético e o romance.

A meu ver, o livro pretendia chamar a atenção para a condição feminina na época da ditadura fascista que se vivia em Portugal. As autoras abordaram, em grande medida, a opressão da mulher à vontade do marido e da família mas também escreveram sobre a sexualidade, o prazer feminino e até afloraram, levemente, a orientação sexual. As "Três Marias" não deixaram de abordar outros problemas que afectavam tanto as mulheres como os homens nos anos 70 como, por exemplo, a guerra colonial e a emigração.

A direcção literária do obra foi de outra mulher corajosa, Natália Correia, que se recusou a fazer cortes naquilo que as autoras escreveram.  Como resultado, a primeira edição foi apreendida e destruída em 3 dias e as autoras foram acusadas de "pornografia e atentado ao pudor". Nos interrogatórios foram instadas no sentido de identificarem quem tinha escrito o quê. Nunca o revelaram até hoje, passados 50 anos e quando só resta uma das autoras viva. Embora tenham ido a tribunal acabaram por não ser julgadas graças à Revolução dos Cravos que acabou com a ditadura e interrompeu o processo. O processo judicial valeu-lhes a solidariedade de inúmeros intelectuais portugueses e estrangeiros bem como de inúmeras feministas. Aliás, "Novas Cartas Portuguesas" é considerado, actualmente, um dos primeiros manifestos feministas.

Na minha opinião, este não é um livro fácil de ler, antes pelo contrário. Esta edição é uma edição anotada o que ajuda imenso porque há certos pormenores que só se entendem se compreendermos as referências políticas e literárias bem como o contexto histórico em que a obra foi dada ao prelo. Nalgumas linhas encontramos, realmente, referências sexuais mas que fazem sentido no âmbito da "história" que as autoras queriam contar. Percebo que a publicação deste livro tenha sido um escândalo, não só pela abordagem sexual mas porque pretendia romper com a ordem estabelecida na sociedade portuguesa. Infelizmente, considero certas passagens muito actuais e acredito que se a obra fosse publicada hoje constituíria, novamente, um escândalo. Chegámos à 3a década do séc. XXI mas as mentalidades retrógradas subsistem. As circunstâncias mudaram mas ainda há muito por fazer para se atingir a igualdade entre homens e mulheres.

Este é um livro que faz pensar. E hoje em dia há tanta preguiça em pôr os neurónios a funcionar, não é verdade? Mas fazer pensar é um dos objectivos mais nobres da literatura.

"Pois que toda a literatura é uma longa carta a um interlocutor invisível, presente, possível ou futura paixão que liquidamos, alimentamos ou procuramos. E já foi dito que não interessa tanto o objecto, apenas pretexto, mas antes a paixão; e eu acrescento que não interessa tanto a paixão, apenas pretexto, mas antes o seu exercício.

(...)

Só de nostalgia faremos uma irmandade e um convento, Soror Mariana das cinco cartas. Só de vinganças, faremos um  Outubro,  um Maio, e novo mês para cobrir o calendário. E de nós, o que faremos?"

 

Parabéns, Bob Dylan

Charneca em flor, 24.05.21

Para mim, a letra das músicas é mesmo muito importante. Para mim, uma boa letra é tão literária como um poema ou um bom romance. Em 2016, a Academia Sueca também deve ter chegado à mesma conclusão porque atribuíu o Prémio Nobel da Literatura a Bob Dylan, músico que completou hoje 80 anos. Para além de dar os parabéns a este talentoso cantautor, quero partilhar a música de Bob Dylan que me acompanhou até casa ao fim da tarde.

"And don't criticize

What you can't understand"

Zitti e Buoni, Måneskin

Charneca em flor, 23.05.21

Esta semana resolvi antecipar o espaço musical do blogue já que vou aproveitar para fazer um pequeno rescaldo do Festival da Eurovisão. 

Este ano não acompanhei este evento como tem sido habitual nos últimos anos. Só conhecia a representação da França, da Itália e de Portugal, como é óbvio.

No princípio, os The Black Mamba não eram a minha escolha mas, actualmente, até gosto da canção e a exibição que fizeram no palco da Eurovisão foi fenomenal. O júri dos países atribuíu-lhes o 7o lugar mas o voto do público ficou aquém das expectativas empurrando os representantes portugueses para o 12o lugar.

Também gostei da música francesa que ficou em 3o lugar mas já foi muito criticada pela semelhança com Edith Piaf em termos de actuação.

Continua a haver muito fogo-de-artíficio, como dizia Salvador Sobral, muitos brilhos, muitos cabelos ao vento. Tudo isso era dispensável para se conseguir sentir a música.

Das músicas que ouvi ontem, gostei da participação da Suécia e da Suiça. Esta manhã soube que o representante da Suécia foi um refugiado. Excelente exemplo de integração. O jovem suiço ficou em 1o lugar na votação do,júri dos países mas foi relegado para 2o lugar pelo voto do público.

O público, ainda, é soberano e deu a vitoria ao Rock' N Roll italiano. Eu já conhecia a música porque o A. acompanhou o Festival de Sanremo que o grupo Måneskin venceu com a música "Zitti e buoni". 

Desde 2006, com a vitória dos finlandeses Lordi, que não vencia uma música desde género musical. Afinal, não há um estilo festivaleiro, qualquer género musical pode vencer desde que as pessoas gostem. Este ano, o público achou que era preciso abanar o capacete .

Aqui ficam os Måneskin com "Zitti e Buoni", que é como quem diz, "quietos e calados" o que é impossível fazer ao ouvir esta música italiana. 

 

Desafio de Escrita dos Pássaros 3.0

Afinal havia outro... fogão

Charneca em flor, 21.05.21

A chave rodou na fechadura com alguma dificuldade o que não me surpreendeu. Afinal, aquela porta já não devia ser aberta há anos.

Durante muito tempo não fui capaz de entrar na casa da minha avó onde passei os momentos mais felizes da minha infância. Mas desde dia negro da “zanga", nunca mais vi a minha avó. Os meus pais levaram-me para longe, cresci e fui-me esquecendo desta pessoa que tanto me amou. Só que ela nunca se esqueceu de mim deixando a sua casa como herança. O meu coração foi invadido pela culpa por ter deixado que a minha avó partisse sem sentir, novamente, o meu abraço e levei anos a decidir voltar aqui.

Depois de algum esforço , lá abri a porta para poder entrar. Logo ali, na entrada, fiquei envolvida, dos pés à cabeça, em teias de aranha. Encontrei uma janela que estava tão perra como a porta. Abri-a permitindo que a claridade do dia iluminasse aquele cenário desolador. Os móveis estavam protegidos com lençóis velhos e plásticos mas, em cima deles, repousava uma espessa camada de pó.

Continuei a explorar a casa da qual me recordava vagamente. Quando encontrei a cozinha, lembrei das muitas horas que passava com a minha avó a cozinhar. Só que aquela cozinha é-me estranha. Não reconheci aquele fogão ou aquela bancada por mais que rebuscasse na minha memória. Não consegui visualizar a minha avó naquele espaço. Talvez a cozinha tivesse sido remodelada.

Olhei através do vidro baço da janela e reparei numa outra construção diante da cozinha. Por coincidência, ou talvez não, ao lado da porta estava uma chave identificada com “cozinha do quintal”. Será…

Meia dúzia de passos separavam a casa principal daquele anexo. Assim que me aproximei, senti-me invadida por uma sensação de conforto. Estranhamente entrei, com relativa facilidade, e comigo entraram também os raios de sol que fizeram brilhar algo que se encontrava em frente da porta. Foi então que o vi, tão reluzente como se fosse novo, o fogão a lenha da minha avó. Só nesse instante é que as recordações regressaram em catadupa. Senti a presença da minha avó visualizando-a enquanto mexia os tachos confeccionando comida reconfortante que me enchia o estômago e a alma. Caí de joelhos diante do fogão a lenha da minha avó e chorei pelo tempo irrecuperável que passei longe dela. 

Pela porta entrou uma brisa que me abraçou e enxugou as lágrimas. Só podia ser a minha avó. Finalmente reconciliei-me com o passado e resolvi começar a limpeza pela maravilhoso fogão da minha avó. Só faltava aprender a cozinhar ali e assim honrar-lhe a memória, entre tachos e tachinhos.

 

Aqui está a minha resposta ao Desafio dos Pássaros.

 

Electric, Katy Perry

Charneca em flor, 17.05.21

Enquanto pesquisava as novidades musicais da última semana encontrei uma canção da Katy Perry que me chamou a atenção. Normalmente prefiro música portuguesa mas achei esta música muito alegre e com uma mensagem muito importante. Gosto sempre de perceber aquilo que as letras transmitem. "Electric" transmitiu-me uma mensagem de luta, esforço e resiliência.

Depois percebi que "Electric" assinala os 25 anos do Pokémon . Aliás, o Pikachu até participa no vídeo .  Claro que é uma mensagem de resiliência. Se bem lembro, os pokémon morriam, ou transformavam-se e voltavam a aparecer, ainda mais fortes. Não há maior exemplo de resiliência 

Divirtam-se e boa semana.

Higher Power, Coldplay

Charneca em flor, 10.05.21

Embora eu ouça música portuguesa, maioritariamente, também gosto de alguns artistas internacionais. Esta semana resolvi partilhar a última música dos britânicos Coldplay, "Higher Power". O lançamento deste single foi peculiar já que os Coldplay entraram em directo com a Estação Espacial, estiveram à conversa com o astronauta francês, Thomas Pesquet, e partilharam o vídeo deste tema. A música é muito animada e uma excelente maneira de começar a semana.

Boa semana. Eu estou de férias 

Desafio de Escrita dos Pássaros 3.0

Tema 1 - Foi o que ouvi

Charneca em flor, 07.05.21

Pela fresca da manhã, a Ti Catrina varria a rua à frente da sua porta. “ Quando o presidente da junta passar por aqui tenho que lhe dizer que os varredores de rua nunca põe cá os pés, quanto mais a vassoura”, pensava ela enquanto manejava a sua. Com o barulho que fazia, nem ouvia os passos arrastados que se aproximavam:

- Bom dia, Ti Catrina. Anda varrendo?

A outra deu um pulo assustada.

- Ai, comadre, que a vi. Já lhe punha os olhos em cima há que tempos. Tem estado doente? me diga que apanhou aquela maleita que veio da estranja.

- Cruzes, credo. Nem me fale nesse bicho. O meu filho se cala com isso. Sempre a dizer que tenho que me meter em casa. Se ele sonha que eu saí, vai ficar azedo como um limão.

- Os meus filhos são iguais. Sempre em fezes por causa desse conovírus ou como é que se chama essa coisa. Então e onde vai a Ti Jaquina? Ao médico?

- Ao médico?! O posto médico está sempre fechado. sei onde se meteu o doutor. Ando aqui com umas dores no lombardo há um ror de dias.

- No lombardo?! será na lombar?!

- É isso, é. Até fui ali à doutora da farmácia e ela deu-me uns pusitórios e uns emplastrios mas estou nada melhor. Disseram-me que há ali um endirêta na rua de baixo que é mûta bom.

- Um endirêta aqui na terra?!

- A Ti Maria Carraça diz que apareceu aí, vindo lá de Lisboa com a filha do falecido Ti Chico da Fonte. Estão a viver na casa do falecido. Diz que vão arranjá-la. A cachopa disse à Ti Maria que estavam fartos de Lisboa e com medo do conovírus e fugiram para cá. Só que a Ti’Anica diz que fugiram doutra coisa.

- Atão e como é que ela sabe?

- A Joana que trabalha na televisão, a filha da Ti’Anica, conhece bem a cachopa do Ti Chico. Diz que foi uma escâdaleira. Fugiram de Lisboa para se amigarem.

- E fugiram de quê?

- Atão não se alembra? A cachopa era casada com um figurão da política com muito mau feitio. Mas a Ti’Anica diz que isso nem foi o pior. O tal endirêta é muito mais novo do que ela e namorava a neta do Ti Chico. A cachopita anda a estudar nessas medicinas novas, alternadeiras ou como é que se chamam.

- Grande pouca vergonha. Então e a Ti Jaquina vai-se meter na casa de gente dessa?

- Ó comadre, desde que passem as dores… quero lá saber em que cama é que o hôme se deita. Se ele afagava a mãe e a filha deve ter muito jeitinho naquelas mãos.

E a Ti Jaquina lá seguiu o seu caminho. A Ti Catrina?! Foi bater à porta da vizinha para lhe contar a sem vergonhice que se passava na casa do Ti Chico.

 

P.S. - Como é Primavera, a passarada voltou a voar através da escrita. Não podia deixar de responder ao desafio deste pardalito. Este tema levou-me às conversas que ouvia quando ia ao Alentejo na minha infância mas também me inspirei nas palavras engraçadas que ouço lá na farmácia. Não é uma obra-prima da literatura mas espero que se divirtam.

 

P.S.2 - tinha-me enganado na hora da publicação. Reposto.