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Livros de Cabeceira e outras histórias

Todas as formas de cultura são fontes de felicidade!

Livros de Cabeceira e outras histórias

Todas as formas de cultura são fontes de felicidade!

1984, George Orwell

Charneca em flor, 30.09.21

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Neste mês de Setembro, o tema proposto pelo clube #umadúziadelivros foi "um livro com apenas uma palavra no título". Inicialmente, pensei em ler o livro "Bela" de Ana Cristina Silva e, talvez, ainda consiga lê-lo mas acabei por pegar neste "1984" para que fosse o livro mais importante deste mês.

Esta obra, de 1949, do britânico Orson Orwell é considerado um clássico da literatura europeia. A minha edição é a que está na imagem com uma belíssima capa de autoria do artista português Vhils.

"1984" é uma obra de ficção política mas também pode ser considerada uma distopia. Nesta história o mundo está dividido em 3 grandes potências, Oceânia, a Eurásia e a Estásia. Na Oceânia, a sociedade é dominada pelo Grande Irmão e pelo Partido e organizada em 3 estratos, o Partido Interno, o Partido Externo e os "proles". Estes pertencem ao nível mais baixo da sociedade e estão fora da influência do Partido. Os membros do Partido são constantemente vigiadas através de um telecrã que, não só vigia, mas também difunde as mensagens que o Partido emite. O Partido determina todos os aspectos da vida dos seus membros, seja o trabalho, a habitação, as relações amorosas e até os pensamentos. O Partido domina tudo desde a informação, a arte, a literatura até ao próprio passado chegando a reescrevê-lo várias vezes.

Presumo que o autor tenha criado esta "sociedade" a partir daquilo que se conhecia sobre os regimes totalitários que emergiam na Europa naquela época, principalmente o regime comunista, o fascismo espanhol, italiano ou português ou mesmo o Nazismo que já tinha terminado aquando da publicação do livro. No entanto, a distopia imaginada pela mente brilhante de Orwell tem um certo paralelismo com aquilo que vivemos hoje com a utilização massiva da Internet e das redes sociais. Aderimos, voluntariamente, a uma espécie de "Grande Irmão" que parece vigiarmos até os pensamentos no sentido em que uma determinada pesquisa faz com que sejamos bombardeados com outras publicações subordinadas ao mesmo tema, por exemplo. Ou a criarmos a nossa bolha nas redes sociais que nos faz acreditar que todas as pessoas pensam da mesma maneira e que concordam connosco.

"1984" é um livro importante para compreendermos a sociedade em que vivemos mas também para termos um vislumbre do que é viver sob o jugo de um regime totalitário baseado na existência de uma única pessoa/Partido. No entanto, não é um livro para qualquer pessoa. Não quero com isto dizer que é um livro para um certo tipo de intelectuais mas que o leitor que pega neste livro deve ter algum interesse e conhecimento em Política e em História mas tem que ter uma visão abrangente e clara da sociedade em que quer viver. Para mim "1984" pode ser uma perigosa arma na mão de alguns negacionistas e chalupas que pululam por aí.

"Lá fora, mesmo através da janela fechada, o mundo parecia frio. Em baixo, na ruam pequenos remoinhos de vento lançavam poeira e papéis rasgados em espirais e, ainda que o sol brilhasse e o céu se mostrasse de um azul severo, parecia não haver cor em nada, exceto nos cartazes afixados por toda a parte. O rosto de bigode negro mirava, sobranceiro, de cada canto e esquina. Havia um na fachada da casa mesmo em frente. O GRANDE IRMÃO ESTÁ A VIGIAR-TE,  dizia a legenda, enquanto os olhos escuros fixava  profundamente os de Winston."

 

 

Desafio Arte e Inspiração #3

Desespero ao entardecer

Charneca em flor, 29.09.21

O entardecer incendiava o céu. Junto à amurada da ponte, Gonçalo seguia com o olhar o curso revolto do rio. Naquela zona, o rio era bastante profundo escurecendo as suas águas. Mesmo assim, a escuridão das águas não se comparava ao negrume que sentia dentro dele. Não sabia que rumo dar à sua vida. Não conseguia conceber como seria o seu futuro, a sua única certeza era a infelicidade que sentia. Ele construíra uma vida mas, no seu íntimo, tinha a consciência que vivia há muito numa mentira. Só que não estava preparado para enfrentar o olhar reprovador dos outros. Ninguém o ia compreender. A única solução que via diante de si passava debaixo daquela ponte. Só precisava de um empurrão de coragem para conseguir ultrapassar aquele obstáculo e perder-se, para sempre, na fundura das águas.

Com força, fincava os dedos no parapeito antigo. Só precisava de mais esforço para seguir o seu destino.

- Atira-te. Não hesites tanto. – a seu lado, alguém cochichava. Não tinha reparado em ninguém ali perto. A pouca distância, viu um vulto. Não percebeu bem de quem se tratava, parecia uma senhora idosa e curvada.

- O que disse?

- Oh, filho, disse para te atirares à água. Tenho mais que fazer, não posso estar aqui o dia todo.

- Mas quem é a senhora? Como é que sabe que eu estava a pensar atirar-me ao rio? Eu nunca partilhei os meus pensamentos em voz alta. – Gonçalo estava atónito.

- Eu sei tudo. Conheço-te ao mais ínfimo pormenor até aos teus pensamentos mais escondidos. Eu sou… eu sou a Senhora da Morte. Estou aqui para te acompanhar na tua passagem.

- Mas veio aqui para me empurrar?! É que eu não tenho assim tanta certeza de que o caminho é este.

- O caminho é para baixo e despacha-te que eu tenho coisas a fazer e sítios para ir. Queres ajuda?

A idosa aproximou-se perigosamente e ele sentiu o frio que emanava da criatura.

- Não, não faças isso. Eu não sei viver sem ti – uma voz familiar gritava ao início da ponte. Era ele, a razão do seu desespero, o homem que ele amava. Quase desde a infância que ele sabia que nunca seria um homem como os outros. Ele sentia-se atraído por outros homens mas a sua família nunca iria aceitar. Para agradar aos seus, ele tinha casamento marcado para dali a uns dias mas sabia que não era justo para a sua noiva. A Margarida era uma grande amiga mas não a amava. Ali, correndo na sua direcção, estava o seu verdadeiro amor, Manel.
Manel abraçou-se a Gonçalo. As lágrimas corriam pelo rosto de ambos.
- Gonçalo, a solução não é esta. Eu estou contigo e não te vou abandonar. Juntos vamos conseguir com lidar com a tua família.

Lentamente, Manel afastou Gonçalo do parapeito da ponte. Unidos, como nunca tinham estado, e lado a lado, afastam-se em direcção ao futuro.

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Gonçalo, ainda, olhou para trás para ver se a Senhora da Morte continuava por lá. No meio da névoa, pareceu-lhe ver uma sombra que se desvanecia-se.

Desta vez, a Senhora da Morte não levou a melhor.

 

Mais uma semana do Desafio Arte e Inspiração. O quadro que nos serviu dr inspiração foi "O Grito" de Edvard Munch.

Quem o terá escolhido? 

No desafio Arte e Inspiração, participam Ana de DeusAna Mestrebii yue, Bruno EverdosaCélia, Cristina AveiroGorduchita, Fátima Bento,  ImsilvaJoão-Afonso MachadoJosé da XãJorge OrvélioLuísa De SousaMaria AraújoMarquesaMiaOlgaPeixe FritoSam ao LuarSetePartidas

Lo que soy, Tiago Nacarato e Mari Segura

Charneca em flor, 27.09.21

A música e o vídeo que escolhi para vos dar música esta semana provam que não é preciso ganhar os concursos de talentos para se ter sucesso no mundo da música.

"Lo que say" foi escrita por Tiago Nacarato e Mari Segura. Ambos os artistas passaram pelo concurso The Voice Portugal. O cantautor português, com raízes brasileiras, participou na 5a edição e chegou ao Top 8. Já Mari Segura nasceu na Colômbia e vive em Portugal há alguns anos e participou na 8a edição ficando-se pelo Top 16. Do encontro destes 2 artistas nasceu esta música tão doce e fresca mostrando que uma das maiores riquezas da nossa cultura é a sua diversidade e a sua hospitalidade para quem vem de fora.

O vídeo contou com outra artista que também passou pelo referido concurso de talentos. Cláudia Pascoal co-realizou e co-produziu o vídeo. Estes encontros musicais dão-me a sensação de que os artistas, em Portugal, são todos amigos. Será mesmo assim?!

Boa semana.

Desafio Arte e Inspiração #2

Junto ao cipreste

Charneca em flor, 22.09.21

Do alto da janela do meu quarto, observo o céu estrelado. No ar nocturno sente-se o aroma a fim de Verão salpicado com o cheiro do alecrim e da alfazema que crescem ali pela serra. Aqui, neste velho palacete, aumenta em mim a esperança de me conseguir reencontrar e voltar a sentir-me viva e inteira.

O que me trouxe até aqui foi, apenas e só, a minha vontade. As minhas deambulações pela internet conduziram-me a este sítio, a esta pequena cidade do sul de França que antevejo da minha janela. O edifício onde estou é antigo e um pouco sinistro. O meu quarto fica numa das torres por isso usufruo de um panorama desafogado da cidade. Todas as noites, antes de me deitar, fico aqui a apreciar esta vista maravilhosa. Gosto de ver as casas da cidade e imaginar como será a vida de quem lá vive. Gostava de me perder naquelas ruelas. Por enquanto, não passa de um projecto porque não me deixam sair daqui. O único contacto com o exterior é quando estico os braços e toco no cipreste, com a ponta dos dedos.
Lá em baixo, o sino do campanário começa a tocar as doze badaladas que assinalam a meia-noite. Já devia estar deitada há muito. Os horários deste hospício onde me encontro são muito rígidos. Daqui a poucas horas, eu e outros como eu teremos que percorrer os corredores para participar nas actividades que farão de nós pessoas mais normais e menos loucas.

Pouco depois de me deitar, sinto que alguém me toca suavemente nos ombros. Ouço alguém falar com alguma urgência mas não é a minha língua materna que oiço. Abro os olhos sem compreender o que se passa nem onde estou. Vários rostos fixam-me com ar preocupado e estupefacto. Começo a perceber o que me diz a pessoa que me acordou. Acho que é um segurança pela roupa que veste:

- Minha senhora, sente-se bem? – o homem fala em inglês. Eu entendo mas não consigo raciocinar o suficiente para lhe responder. Assim sorrio e aceno com a cabeça.

As outras pessoas desinteressam-se de mim e começam a afastar-se. Alguém me pergunta:

- És portuguesa, não és? Precisas de ajuda? – é uma mulher que fala.

- Sim, sou portuguesa. Como sabes?

A mulher diz algo ao segurança que se desvia ligeiramente.

- Há pouco, ouvi-te murmurar e pareceu-me português .

- O que é que aconteceu? Onde estou?

- Estás no MoMa*, em Nova Iorque. Quando cheguei, já estavas deitada nesse banco e parecias adormecida. Pelo que percebi, viram-te como ar de quem estava em transe a olhar para um quadro. Até derrubaste as barreiras de protecção e tocaste no quadro a ponto de disparar os alarmes. Nesse momento, vieste deitar-te no banco. Os turistas que andavam por aqui disseram que parecias sonâmbula. Estás sozinha? Será melhor chamarmos os paramédicos?

- E que quadro era?

- Aquele, o “Starry Night" do Van Gogh.

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A minha patrícia atenciosa afasta-se e ajuda-me a sentar no banco. Diante de mim, vejo a paisagem que se via do meu quarto no hospício soberbamente pintada pela mestria de Vincent Van Gogh. Eu estive dentro de um quadro de Van Gogh. Não, não digam que foi um sonho. Eu estive mesmo naquele hospício. Ainda sinto o aroma do alecrim e da alfazema nas minhas narinas e na ponta dos dedos guardo a sensação de tocar nos ramos do cipreste. Estarei tão louca como o pintor holandês do séc. XIX? Ou serei uma reencarnação? Instintivamente levo a mão à minha orelha esquerda.

*Museu de Arte Moderna de Nova Iorque

Quem terá escolhido este quadro? Talvez a Fátima Bento.

 

Este texto é a minha participação no Desafio Arte e Inspiração lançado pelo blogue Porque Eu Posso e conta com a participação de Ana de DeusAna Mestrebii yue, CéliaCristina Aveiro, Fátima BentoGorduchitaImsilvaJoão-Afonso MachadoJosé da XãJorge OrvélioLuísa De SousaMariaMaria AraújoMarquesaMiaMartaOlgaPeixe FritoSam ao LuarSetePartidas

 

Eco, Carolina Deslandes

Charneca em flor, 20.09.21

Carolina Deslandes é uma das artistas mais surpreendentes do panorama musical português. Escreveu algumas das mais bonitas canções dos últimos anos. Nunca tem medo de arriscar. Já disse que era um amor para a vida toda para depois chegar à conclusão de que "fomos quase tudo, foi por um triz". Em Novembro, apresentou a curta-metragem "Mulher", de sua autoria, no Dia Internacional Pela Eliminação da Violência Contra As Mulheres, através da qual pretendia chamar a atenção para a problemática da violência doméstica.

Na última semana, volta a surpreender apresentando a música "Eco" na conceituada plataforma digital internacional, Colors. Como já nos habituou, uma letra brilhante na qual apela à empatia. Espero que gostem. 

Boa semana.

Silêncio

Do silêncio eu faço um grito

E o corpo todo me dói

Deixai-me chorar um pouco

Não escrevas empatia
Se não queres saber
Olha pra Palestina
E pras casas a arder
Olha pra Colômbia
E pro apelo à liberdade
Pra polícia, pra milícia
Para a agressividade

E queres falar do quê?
Da loja que fechou
Da festa que alguém cancelou
Da roupa que não compraste
E ‘tás a falar do quê?
Das amigas que não viste
Quando a tristeza insiste
Em pintar a cidade?

Não te vale o hashtag
Se a alma é pequena
Não há cardinal que salve
Nem clout que roube a cena
O sangue corre nas ruas, bombas que caiem do céu
De famílias como a tua, que ninguém socorreu

Não me ouças, não me sigas se tu não te importas
Eu vim pra abrir ao pontapé todas as portas
Vim pra falar de genocídio, de racismo ao microfone
Há quem se esconda no cinismo, eu meto a boca no trombone
E rezo a Deus, acendo a vela e pergunto
Porque é que nos deste a terra se não governaste o mundo?
Porque é que nos deste a guerra e a vontade de querer tudo?
Porque é que quem sofre berra e quem governa é surdo?

Abraço os meus filhos esta noite com firmeza
Agradeço a paz e a comida na mesa
E só penso em quem ficou sem nada
Na sopa dos pobres, na sopa da mágoa
Não escrevas empatia só pra aparecer
Ser empático é comparecer
É sofrer por ver alguém sofrer,
É a ferida no corpo do outro que insiste em doer

Que insiste em doer
Que insiste em doer
Que insiste em doer

Silêncio
Do silêncio eu faço um grito

O corpo todo me dói

Deixai-me chorar um pouco

Silêncio
Do silêncio eu faço um grito
O corpo todo me dói
Deixai-me chorar um pouco

"Debaixo de Algum Céu", Nuno Camarneiro

Charneca em flor, 19.09.21

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No passado mês de Agosto bati o meu recorde de livros lidos num mês. No total, foram 6 livros embora, para ser mais exacta, a leitura de "Debaixo de Algum Céu" começou em Julho mas foi terminada nos  primeiros dias das minhas férias. Ao que parece, ontem assinalava-se o Dia Internacional de ler um ebook e lembrei de que ainda não tinha partilhado a minha opinião sobre esta obra, que li na versão ebook.

Nunca tinha lido nada de Nuno Camarneiro embora tivesse ouvido falar nele na altura em que lhe foi atribuído o Prémio Leya 2012 por este livro.

A história passa-se nos dias que vão desde o Natal até ao Ano Novo e, maioritariamente, circunscritos a um prédio construído junto ao mar. Nesse prédio vivem as personagens, de várias idades e circunstâncias.Homens e mulheres, novos e velhos, crianças, idosos, jovens adultos e adolescentes.

Nuno Camarneiro leva-nos a espreitar pela janela e a descobrir a vida destas pessoas, os seus anseios, sonhos e problemas. Estas histórias podiam ser o relato da vida de qualquer um de nós ou de quem vive ao nosso lado. A maioria de nós vive em prédios, com toda a certeza. Às vezes nem conhecemos quem vive ali tão perto, não sabemos se sofrem ou precisam de ajuda. E foi nisso que as palavras de Nuno Camarneiro me fizeram pensar.

O autor  leva-nos a mergulhar, não na água do mar que se avista das janelas, mas nas vidas daquelas pessoas e a acompanha-las ao longo daqueles dias entre o ano que finda e o ano que começa. Sempre senti esses dias com alguma estranheza porque sempre me pareceu que já não pertencem ao ano que termina mas também ainda não pertencem ao novo ano. Também gostei muito de Nuno Camarneiro me levar a espreitar pela janela daquelas pessoas, eu que adoro espreitar, discretamente, pelas janelas sem cortinas. Não porque seja coscuvilheira mas por pura curiosidade pela maneira como as outras pessoas vivem.

Gostei muito deste livro. Nuno Camarneiro parece ser um grande observador de pessoas e um profundo conhecedor da natureza humana. O livro está muito bem escrito e é pontuado por frases sublimes. Só tive pena de não ter lido esta obra há mais tempo e fiquei interessada em ler mais obras dele. Infelizmente não são muitas.

"Uma história são pessoas num lugar por algum tempo. As margens da página, como o silêncio, estabelecem limites certos para que um conto não se confunda com o que não lhe pertence. Pode contar-se uma história enchendo uma caixa vazia ou desenhando paredes à volta da gente.

(...)

O medo nasce em qualquer lugar, como erva daninha por dentro. O medo suporta tudo e cresce no escuro até ser adulto, até ser do tamanho de um homem, e lhe tomar o corpo e pensar por ele."

 

 

 

 

Desafio Arte e Inspiração #1

A fúria do mar

Charneca em flor, 15.09.21

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 "A Grande Onda de Kanagawa" 

Katsushika Hokusai

 

A meteorologia anunciou, há pouco, alerta vermelho em todo o país devido ao mau tempo causado pela tempestade que se aproximava.

As entidades competentes desaconselham a presença em zonas junto do mar mas o temporal não será maior do que o turbilhão que sinto dentro de mim. Quando me sinto muito ansiosa é o mar que me acalma. A grandiosidade do oceano faz-me tomar contacto com a minha pequenez e consigo colocar qualquer problema em perspetiva.

O parque de estacionamento da praia está quase vazio. Sem sair do automóvel, olho as ondas gigantescas. O mar é como uma pessoa furiosa, com vontade de destruir tudo à sua volta. Realmente, algumas pessoas afadigam-se à volta do bar da praia para protegerem a frágil construção antes da temporal chegar em força.

Apesar do perigo eminente, o perpétuo movimento daquela massa de água exerce uma irresistível atracção sobre mim. Não tenho forças para lutar contra o magnetismo do mar. Ainda hesito mas saio do automóvel e caminho pela areia da praia.

“E se eu entrasse na água? Talvez nunca mais voltasse e todos os meus problemas se transformariam em espuma dos dias.” Estes pensamentos atravessam o meu espírito enquanto a ondulação se torna cada vez mais impressionante.

De repente, há uma onda que me envolve. Não luto com ela e deixo-me ir. Ao longe alguém grita por mim mas estou perdida no abraço das ondas do mar que ora me arrastam para as profundezas, ora me erguem na crista da onda até que desapareço da face da terra em direcção a uma luz muito brilhante. O túnel formado por aquela massa de água abre-se no lugar mais bonito que já vi. Os meus olhos estão incrédulos com a paisagem que conseguem observar; verdes prados, cascatas brilhantes, animais saltitantes e pessoas felizes, tudo iluminado pelo sol radioso. A pouca distância vejo alguém, estranhamente, familiar. É um homem de longas barbas brancas, olhar doce e braços abertos para me receber:
- Não me reconheces, minha filha? Sou o teu Deus. Tanto clamaste por mim que pedi ao mar que te trouxesse para o Paraíso.

O medo invade-me as entranhas. Verdadeiramente, eu não queria morrer. Só queria desfazer-me dos problemas. Este sítio é maravilhoso mas como é que digo a este Senhor: “Enganei-me, por favor deixe-me voltar à minha vida.”?

 

Hoje inicia-se o Desafio Arte e Inspiração organizado pela inexcedível Fátima Bento do blogue Porque Eu Posso.

A ideia consiste em excrever um texto inspirado num quadro. Achei a ideia excelente porque a pintura é uma forma de arte que me interessa muito. O quadro proposto é escolhido por um dos participantes. Consfesso que não conhecia este quadro e estou intrigada com quem o terá escolhido. Vou apostar no José da Xã.

No desafio Arte e Inspiração, participam Ana DAna de DeusAna Mestrebii yue, Célia, ConchaCristina AveiroFátima Bento GorduchitaImsilvaJoão-Afonso MachadoJosé da XãJorge OrvélioLuísa De SousaMariaMaria AraújoMarquesaMiaMartaOlgaPeixe FritoSam ao Luarsetepartidas

 

 

 

I get a kick out of you, Lady Gaga e Tony Bennett

Charneca em flor, 07.09.21

Esta semana, a música chega um pouco atrasada. A escolha recaiu sobre esta parceria entre Lady Gaga e Tony Bennett.

Esta foi a segunda vez que Lady Gaga e Tony Bennett se juntaram para gravar um álbum. Infelizmente o cantor, de 95 anos, anunciou a sua retirada dos palcos no passado mês de Agosto.

Optei por esta música porque estive a ver o filme "A star is born" e tive curiosidade pela música da Lady Gaga que não conheço muito bem.

Espero que gostem. Boa semana.