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Livros de Cabeceira e outras histórias

Todas as formas de cultura são fontes de felicidade!

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Desafio de Escrita dos Pássaros 3.0

Tema 1 - Foi o que ouvi

Charneca em flor, 07.05.21

Pela fresca da manhã, a Ti Catrina varria a rua à frente da sua porta. “ Quando o presidente da junta passar por aqui tenho que lhe dizer que os varredores de rua nunca põe cá os pés, quanto mais a vassoura”, pensava ela enquanto manejava a sua. Com o barulho que fazia, nem ouvia os passos arrastados que se aproximavam:

- Bom dia, Ti Catrina. Anda varrendo?

A outra deu um pulo assustada.

- Ai, comadre, que a vi. Já lhe punha os olhos em cima há que tempos. Tem estado doente? me diga que apanhou aquela maleita que veio da estranja.

- Cruzes, credo. Nem me fale nesse bicho. O meu filho se cala com isso. Sempre a dizer que tenho que me meter em casa. Se ele sonha que eu saí, vai ficar azedo como um limão.

- Os meus filhos são iguais. Sempre em fezes por causa desse conovírus ou como é que se chama essa coisa. Então e onde vai a Ti Jaquina? Ao médico?

- Ao médico?! O posto médico está sempre fechado. sei onde se meteu o doutor. Ando aqui com umas dores no lombardo há um ror de dias.

- No lombardo?! será na lombar?!

- É isso, é. Até fui ali à doutora da farmácia e ela deu-me uns pusitórios e uns emplastrios mas estou nada melhor. Disseram-me que há ali um endirêta na rua de baixo que é mûta bom.

- Um endirêta aqui na terra?!

- A Ti Maria Carraça diz que apareceu aí, vindo lá de Lisboa com a filha do falecido Ti Chico da Fonte. Estão a viver na casa do falecido. Diz que vão arranjá-la. A cachopa disse à Ti Maria que estavam fartos de Lisboa e com medo do conovírus e fugiram para cá. Só que a Ti’Anica diz que fugiram doutra coisa.

- Atão e como é que ela sabe?

- A Joana que trabalha na televisão, a filha da Ti’Anica, conhece bem a cachopa do Ti Chico. Diz que foi uma escâdaleira. Fugiram de Lisboa para se amigarem.

- E fugiram de quê?

- Atão não se alembra? A cachopa era casada com um figurão da política com muito mau feitio. Mas a Ti’Anica diz que isso nem foi o pior. O tal endirêta é muito mais novo do que ela e namorava a neta do Ti Chico. A cachopita anda a estudar nessas medicinas novas, alternadeiras ou como é que se chamam.

- Grande pouca vergonha. Então e a Ti Jaquina vai-se meter na casa de gente dessa?

- Ó comadre, desde que passem as dores… quero lá saber em que cama é que o hôme se deita. Se ele afagava a mãe e a filha deve ter muito jeitinho naquelas mãos.

E a Ti Jaquina lá seguiu o seu caminho. A Ti Catrina?! Foi bater à porta da vizinha para lhe contar a sem vergonhice que se passava na casa do Ti Chico.

 

P.S. - Como é Primavera, a passarada voltou a voar através da escrita. Não podia deixar de responder ao desafio deste pardalito. Este tema levou-me às conversas que ouvia quando ia ao Alentejo na minha infância mas também me inspirei nas palavras engraçadas que ouço lá na farmácia. Não é uma obra-prima da literatura mas espero que se divirtam.

 

P.S.2 - tinha-me enganado na hora da publicação. Reposto.

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