Ensaio sobre a Lucidez, José Saramago
Aqui há meses comprei 2 livros do nosso Prémio Nobel da Literatura, José Saramago, o “Ensaio sobre a cegueira” e o “Ensaio sobre a lucidez".
Não tive coragem de pegar no “Ensaio sobre a cegueira” e achei por bem começar pelo “Ensaio sobre a lucidez”. Má opção porque neste são feitas referências ao “Ensaio sobre a cegueira”. Fica a dica. Por acaso não me fez muita diferença porque vi o filme baseado neste livro de Saramago. Mesmo assim acho que não me tirou a vontade de ler o "Ensaio sobre a cegueira"
Posto isto, vou avançar para a minha opinião sobre esta leitura.
A narrativa parte de um acto eleitoral para eleger os órgãos autárquicos. No dia marcado, o país imaginado por Saramago é acometido por chuva torrencial o que dificulta a ida às urnas por parte dos leitores. Quando se pensava enfrentar uma elevadíssima abstenção, eis que pára de chover e as pessoas acabam por se dirigir às mesas de voto. Só que os resultados obtidos são surpreendentes. Enquanto no resto do país se obtêm resultados equiparados aos de eleições anteriores, na capital do país observa-se uma percentagem extremamente elevada de votos em branco. Os governantes do país não percebem a mensagem que os eleitores quiseram transmitir e suspeitam tratar-se de uma conspiração. A investigação desta suposta conspiração vai conduzir a tempos muito difíceis para a cidade, capital do tal país imaginado por Saramago. A situação imaginada pelo autor não é muito diferente daquilo que se vive pela Europa fora embora por motivos de saúde.
Tal como a maioria dos livros deste autor, a utilização da pontuação é muito peculiar por isso é preciso estar muito concentrada na leitura senão não se consegue entender. O caminho que o autor seguiu é muito interessante mas, como é habitual, faz-nos pensar e tirar as nossas próprias conclusões. O final é surpreendente. Eu nunca imaginei que terminaria assim.
Para mim, os votos em branco são uma maneira de a classe política perceber que deve repensar a forma de exercer o poder. Isso era verdade em 2004, quando o livro foi editado pela 1a vez, mas continua a ser verdade hoje. Saramago conseguia, sempre, escrever obras intemporais pois fazia uma excelente análise da sociedade. Um livro que vale a pena ler e que nos faz pensar. E precisamos mesmo de exercitar o raciocínio e não aceitar, cegamente, tudo aquilo que nos querem fazer acreditar.
"Ao ministro da defesa, um civil que não havia ido à tropa, tinha sabido a pouco a declaração do estado de exceção, o que ele tinha querido era um estado de sítio a sério, dos autênticos, um estado de exceção na mais exata aceção da palavra, duro, sem falhas de nenhum tipo, como uma muralha em movimento capaz de isolar a sedição para logo a esmagar num fulminante contra-ataque, Antes que a pestilência e a gangrena alastrem à parte ainda sã do país, preveniu."