Manhã de esperança
- Oh, Luísa, compreendo perfeitamente o que sentes. Mas, não te deves sentir envergonhada. Esses 2 espécimes de hominídeos são indignos de ti. Fizeste bem em afastar-te. Claro que nem queres ouvir falar em homens agora mas, acredita, que as pessoas, sejam homens ou mulheres, não são todas iguais.
- Achas que não, Maria? Tu gostas muito do Filipe, pelo que percebo, mas não sei se ele é assim tão diferente. Afinal, assim que pôde, descartou aquela mulher que estava com ele.
- Bom, Luísa, tal como eu e o Fernando não contámos ao Filipe, a conversa que tiveste connosco ao jantar, eu também não posso partilhar contigo aquilo que ele nos contou. Não me quero armar em casamenteira mas ainda acho que devias, ao menos, conversar com ele. Suspeito que mexeste com ele tanto como ele mexeu contigo.
- Mas como é que sabes se ele mexeu comigo? Eu acho que não disse nada sobre isso.
- É, apenas, um palpite. Eu senti ali alguma química quando ele entrou na sala de jantar. Era palpável.
Luísa voltou a corar e não conseguiu evitar um sorriso. Maria sabia ler os sinais.
- Bom, já é tarde. É melhor irmos dormir. Obrigada pelo chá e por me ouvires, Maria.
- Eu é que agradeço a confiança.
- Se calhar, vou antecipar o meu regresso a casa.
- Mas, porquê? Acabaste de dizer que te sentias bem aqui. É por causa do Filipe? Ele não te vai perseguir, descansa. Não é pessoa para isso. A não ser que tu queiras – rematou Maria rindo.
- Não é por ele porque mal o conheço mas tenho medo daquilo que me fez sentir na cascata. Confesso que me perturbou.
- Não tenhas receio. Quem sabe até tenhas uma boa surpresa aqui na aldeia. Não te preocupes que esta conversa não saí desta cozinha. Dorme bem.
Apesar de tudo, Luísa dormiu muito bem e acordou com excelente disposição. Resolveu ficar mais uns dias ali na aldeia. Agora que estava desempregada, era dona do seu tempo. E se encontrasse Filipe, logo se via o que aconteceria.
Depois de se arranjar, desceu para tomar o pequeno-almoço. Como era dia de semana, havia poucos hóspedes. Apenas ela e um casal de meia-idade que se recolhiam cedo e madrugavam pela manhã. Raramente se cruzava com eles, faziam grandes caminhadas que envergonhavam pessoas mais jovens.
Quando a viu chegar, Maria sorriu-lhe com carinho enquanto lhe servia o pequeno-almoço. O ambiente na pousada era mesmo acolhedor tal como toda a aldeia. Não imaginava melhor lugar para se recuperar e para planear os passos que daria a seguir. Mas por enquanto só queria pensar no momento presente e naquela manhã soalheira. Com um livro debaixo do braço, caminhou até à praia fluvial da aldeia e instalou-se na esplanada.
Antes de abrir o romance que estava a ler, olhou em volta e reparou que, numa mesa mais distante, um homem de boné desenhava concentrado e absorto.
“É um artista, desenha maravilhosamente”, as palavras de Maria ecoaram na sua cabeça.
Seria ele? Seria Filipe, o rapaz da cascata? Sentiu o seu coração bater descompassado. A sua cabeça não conseguia controlar as suas emoções.
Como se pressentisse que estava a ser observado, Filipe levantou a cabeça e o seu olhar, intenso, cruzou-se com o olhar dela.