Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Livros de Cabeceira e outras histórias

Todas as formas de cultura são fontes de felicidade!

Livros de Cabeceira e outras histórias

Todas as formas de cultura são fontes de felicidade!

Almoço de Domingo, José Luís Peixoto

Charneca em flor, 02.07.21

20210701_154146.jpg

Já quando li o "Autobiografia" de José Luís Peixoto, achei que tinha lido o melhor livro do autor. Só que José Luís Peixoto superou-se e conseguiu escrever um livro ainda melhor. "Almoço de Domingo" é um romance biográfico sobre a vida do alentejano de Campo Maior e fundador da Delta Cafés, Comendador Rui Nabeiro. Foi o próprio retratado que despoletou o processo que conduziu a esta obra convidando o escritor a escrever a sua biografia. No entanto, José Luís Peixoto, com o acordo do Sr. Rui, partiu da vida contada pelo Comendador e construíu um maravilhoso romance. A história de vida de Rui Nabeiro já é fascinante mas, através das palavras do autor, tornou-se num excelente romance. Nestas páginas sentimos o aroma do café, o cheiro e o calor das terras alentejanas e sente-se o carinho que o Sr. Rui Nabeiro inspira no povo de Campo Maior. A acção decorre durante 3 dias, de 26 a 28 de Março de 2021, dia em que Rui Nabeiro completou 90 anos. JLP imaginou o quotidiano do retratado a partir das conversas que teve com ele bem como os próprios pensamentos em que a personagem Rui Nabeiro vai recordando a sua vida ao longo dos seus 90 anos. Simplesmente brilhante e muito bem escrito como é hábito.

"O passado tem de provar constantemente que existiu. Aquilo que foi esquecido e o que não existiu ocupam o mesmo lugar. Há muita realidade a passear-se por aí, frágil, transportada apenas por uma única pessoa. Se esse indivíduo desaparecer, toda essa realidade desaparece sem apelo, não existe meio de recuperá-la, é como se não tivesse existido."

"Que rosto tem uma pessoa? No fim da vida, entre todos os rostos que teve, qual é o rosto que realmente a representa? Será que o último rosto, por ter sobrevivido a todos os outros, é o mais válido? Não lhe custava encontrar argumentos contra essa ideia."

 

Uma Casa na Escuridão, José Luís Peixoto

Charneca em flor, 23.03.21

IMG_20210309_132254.jpg

José Luís Peixoto é um dos meus escritores contemporâneos preferidos. Tenho, praticamente, todos os seus livros. No entanto, sentia uma mágoa na minha relação com as suas obras. Não tinha conseguido terminar este "Uma Casa na Escuridão". Agora, graças à minha participação  no clube de leitura Uma Dúzia de Livros, voltei a ele e percebi porque é que não o tinha conseguido ler. Este livro não é de leitura fácil. Sei que desisti de ler numa passagem,  particularmente, violenta. Na verdade, acho que me faltava uma certa maturidade como pessoa e como leitora para conseguir levar até ao fim esta tarefa de terminar o livro.

"Uma Casa na Escuridão" foi editado, pela primeira vez, em 2002. No ano anterior, José Luís Peixoto tinha ganhado a 2a edição do Prémio Saramago. Na minha opinião, foi necessária alguma coragem, da parte do escritor e do editor, para publicar este livro. A história é estranha, algumas situações são descritas de forma violenta e crua de tal maneira que tive vontade de fechar os olhos para não ler, como fazemos com os filmes, e tentei não imaginar as cenas criadas por José Luís Peixoto. Não consegui lidar com aquele horror. 

Há livros que valem pelo conteúdo e outros valem pela forma. "Uma Casa na Escuridão" vale, sobretudo, pela forma embora eu tenha conseguido começar a perceber aonde o autor queria chegar. Se calhar, ainda terei que ler o livro mais vezes para conseguir compreender esta obra na sua plenitude. Ou talvez a compreensão esteja fora do meu alcance.

Esta obra vale a pena, sobretudo, pela linguagem. José Luís Peixoto brinca com as palavras e escreve frases  maravilhosas e encantadoras mesmo quando conta uma história tão particular como esta. Seja como fôr, não sei se considere esta obra como uma prosa poética ou uma gigante metáfora de mais de 250 páginas. O que sei é que será difícil esquecer aquilo que li nestas folhas.

"era costume ela vir cá e ficar a sussurrar um bule de chá com a minha mãe"

"O amor é o sangue do sol dentro do sol. A inocência repetida mil vezes na vontade sincera de desejar que o céu compreenda. Levantam-se tempestades frágeis e delicadas na respiração vegetal do amor. Como uma planta a crescer da terra. O amor é a luz do sol a beber a voz doce dessa planta. Algo dentro de qualquer coisa profunda. O amor é o sentido de todas as palavras impossíveis."

"As estrelas espalhadas, as nuvens a passarem como pessoas tristes, o céu da noite sem lua, o céu da noite escuro e sem lua. Eu acreditava que o amor é a inocência sufocada mil vezes na vontade ridícula de desejar que o céu compreenda."

Herdeiros de Saramago

Charneca em flor, 16.11.20

Espero não chegar muito tarde a casa, hoje. Pelas 22h30m quero estar à frente da televisão para assistir à série documental, "Herdeiros de Saramago". A partir de uma ideia de Carlos Vaz Marques e realizada por Graça Castanheira, a série pretende fazer um retrato mais intimista dos 11 galardoados com o Prémio Saramago. No primeiro episódio vamos acompanhar Paulo José Miranda, que foi o primeiro galardoado em 1999, e José Luís Peixoto, o mais jovem a ser premiado em 2001. 

Nos próximos episódios poderemos conhecer melhor Adriana Lisboa, Gonçalo M. Tavares, Valter Hugo Mãe, João Tordo, Afonso Reis Cabral, Julián Fuks, Bruno Vieira Amaral, Ondjaki e Andréa del Fuego.

Não conheço todos estes autores. Dos que já li, José Luís Peixoto é aquele que conheço melhor. Aliás, sou grande, grande fã do escritor mas também da pessoa. De Gonçalo M. Tavares e Valter Hugo Mãe só li "Jerusalém" e "A desumanização", respectivamente. A obra de João Tordo conheço de forma mais extensa, principalmente, os primeiros livros e também gosto muito de Afonso Reis Cabral embora este autor ainda seja muito jovem e não tenha, ainda, muitos livros editados mas penso que continuará a dar que falar.

Quem sabe, esta série seja o gatilho para ir à procura dos livros dos outros premiados?

Autobiografia, José Luís Peixoto

Charneca em flor, 12.02.20

250x.jpeg

Este foi o livro com que inaugurei o meu ano literário. Há muito tempo que sigo o trabalho de José Luís Peixoto. Já mencionei aqui que é um dos meus autores favoritos. Sou uma fã quase incondicional. Só assim se explica o facto de já o ter mencionado em 14 posts (!) É por isso que, com conhecimento de causa, afirmo que este é o melhor romance de José Luís Peixoto até à data. A história é brilhante e a execução é magistral. Para além disso, acho que JLP tem uma grande coragem. Ou será um grande descaramento?! Só assim se explica que tenha feito de José Saramago, uma personagem de romance. Relembro que JLP foi o 2o autor a ser agraciado com o Prémio Saramago em 2001. Assim presumo que esta "Autobiografia" seja também uma forma de o autor prestar uma homenagem à influência que Saramago teve na sua própria obra. 

Em "Autobiografia", encontramos um jovem autor, José, que luta para escrever o seu 2o romance quando é convidado para escrever uma biografia do já consagrado José Saramago. Ao longo do romance, os 2 escritores vão-se confundindo de tal maneira que já não sabemos onde termina José e começa Saramago, e vice versa. A estrutura do romance não é linear mas sim constituída por várias camadas que se "enrolam" sobre si próprias e povoada por várias personagens, curiosas e interessantes, se cruzam nesta impressionante narrativa É preciso termos cuidado para não nos afogarmos quando mergulhamos nesta história. 

Esta "Autobiografia" despertou-me uma imensa curiosidade sobre os livros de Saramago que ainda não li. JLP leva-nos pela mão até à obra de José Saramago.

Para mim, quem for apaixonado pela escrita de José Luís Peixoto ou pela obra de José Saramago, não devia deixar de ler esta "Autobiografia". Na companhia deste livro, viverão momentos inesquecíveis.

"Talvez, mas não vejo as coisas assim.

Não? Foi o que pareceu e, na literatura, tem de se prestar muita atenção às aparências. Estava farto de juntar palavras? Depois de centenas de páginas escritas, gastam-se os olhos e a cabeça, perde-se algum sentido mas, em grande medida, escrever romances é ser capaz de resistir a esse cansaço. As explicações são uma saída fácil, uma desistência, não acha?

A sério, não acha?

Talvez, mas prefiro mudar de assunto"

 

 

 

 

Desafio "Uma citação por semana" #9

Charneca em flor, 26.02.18

O distante perde distância quando se vai lá. Os lugares mais longínquos são aqueles onde nunca se esteve. Quando já se foi a um lugar, mesmo que seja preciso atravessar o planeta, fica a saber-se que é possível fazer esse caminho. Deixa de pertencer ao desconhecido sem detalhes, ganha formas imprevistas. Há vida lá como há vida aqui.

                                    José Luís Peixoto, O Caminho imperfeito