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Livros de Cabeceira e outras histórias

Todas as formas de cultura são fontes de felicidade!

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Lendários, Tracy Deonn

Charneca em flor, 14.02.23

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Desde que resolvi aderir a clubes de leitura, tenho lido uns quantos livros fora da minha zona de conforto. Este "Lendários" é um bom exemplo disso uma vez que se trata de um livro de fantasia. Aliás já não lia livros deste género desde o fim da adolescência quando li a série "As Brumas de Avalon"

A leitura deste livro teve alguns percalços. Primeiro que tudo, não lhe consegui pegar em Dezembro* devido a este livro. Em seguida, quando estava completamente embrenhada na história, descobri um defeito no meu exemplar e tive que o devolver e esperar por um novo. Percalços à parte, foi uma leitura mesmo fantástica como é natural tendo em conta o estilo .

"Lendários" conta a lenda do Rei Artur mas de uma forma actualizada. A figura central é Bree, uma jovem que vai estudar para uma Universidade da Carolina do Norte ao mesmo tempo que tenta lidar com o luto pela morte repentina da mãe. Na sua primeira saída à noite, assiste a um ataque demoníaco acabando por se cruzar com os Lendários, uma sociedade secreta que reúne estudantes universitários que se afirmam descendentes dos Cavaleiros da Távola Redonda. Através do contacto com os Lendários, Bree confronta-se com os seus próprios poderes que desconhecia e que vai ter que aprender a controlar.

A autora conseguiu desenvolver uma história muito interessante e tão envolvente que não se consegue deixar de ler até à última página. Só que depois encontramos um final aberto que estende uma ponte para o segundo livro da saga.

A escrita é mesmo cativante e Tracy Deonn conseguiu abordar temas muito diferentes, e inesperados, de forma magistral. Nunca imaginei que fosse possível entrelaçar a cultura afro-americana sulista com a lenda do Rei Artur. Esta junção de temas permitiu incluir o racismo como um dos temas mais importantes deste "Lendários". Também nunca imaginaria encontrar aqui uma excelente reflexão sobre o luto e sobre como a perda de alguém transforma a vida de quem fica. A autora até conseguiu incluir uma personagem não binária de forma muito natural. Nem todos os autores o conseguem.

Tal como alguns dos livros que li no ano passado, eu não faço parte do público-alvo deste livro mas adorei esta leitura. Fiquei muito envolvida com estas personagens e com esta história. "Lendários" lê-se com muita facilidade apesar das suas mais de 500 páginas. Foi muito bom viajar no tempo e relembrar-me da jovem que se embrenhou n' "As Brumas de Avalon".

 

"Ser capaz de seguir o rasto da própria família até tão longe é algo que nunca imaginei. A minha familia apenas conhece a geração que se seguiu a Emancipação. De repente, é difícil estar aqui e absorver a magnificência da Muralha e não sentir uma inegável sensação de ignorância e inadequação. Depois, uma onda de frustração, porque provavelmente houve alguém que quis gravar tudo, mas quem poderia ter escrito a história da minha família até aqui? Quem teria sido capacitado, ensinado, autorizado a fazê-lo? Onde está a nossa Muralha? Uma Muralha que não me faça sentir perdida, mas sim encontrada. Um Muralha que se sobreponha a qualquer pessoa que lhe ponha os olhos em cima.

Em vez de admirada, sinto-me... injustiça."

 

P.S. - Emancipação refere-se à Proclamação da Emancipação assinada em 1862 pelo presidente dos EUA, Abraham Lincoln, dando início ao processo de abolição da escravatura nos estados confederados norte-americanos.

*"Lendários" foi uma das escolhas de Dezembro no Clube do Livra-te.